Avenida Brasil, altura de Padre
Miguel. 42,5º. Paro o carro no primeiro posto que vejo.[1]
Não porque precisava abastecê-lo, mas porque precisava lavá-lo. O serviço era
feito por um monte de moleques, magrinhos que só. Uns mais velhos, uns mais
novos. Todos pretos. Alegres, trocavam ideia entre si enquanto lavavam os
carros e se esquivavam do calor como podiam. Não reclamavam de nada. Observo a
cena a meia distância, abrigado na única sombra que acho, junto a um muro e um
banco de concreto.
- Aê, Crioulo, pega o pano aê!
- Negão, dá um valor aqui pra mim!
Chamavam-se, eles mesmos, de
crioulo e negão e que tais. Pensei em perguntar o porquê. Dizer na boa que
aquilo, de alguma maneira, os desvaloriza e, mais do que isso, desvaloriza a
todos nós e tudo o mais. Mas meu impulso professoral - não pela primeira vez -
é natimorto. Definitivamente não tenho nenhuma vocação pra convencer ninguém de qualquer coisa que seja. Por ninguém também quero dizer eu mesmo, esteja visto.
- Tá novo, meu chefe!
Pego a
carteira e, antes que pudesse abrí-la, o mais desenvolto deles me diz com ar de
quem se garante:
- Calma, calma, é melhor não se
precipitar. Dá uma olhada aí e vê primeiro se tá bem feito.
Dou uma risadinha de canto de boca. Confiro o resultado
displicentemente, pego a chave do carro e deixo dez pratas a mais de gorjeta.
Era sexta-feira. E os moleques merecem.
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