sexta-feira, 30 de outubro de 2015

Lava Jato



Avenida Brasil, altura de Padre Miguel. 42,5º. Paro o carro no primeiro posto que vejo.[1] Não porque precisava abastecê-lo, mas porque precisava lavá-lo. O serviço era feito por um monte de moleques, magrinhos que só. Uns mais velhos, uns mais novos. Todos pretos. Alegres, trocavam ideia entre si enquanto lavavam os carros e se esquivavam do calor como podiam. Não reclamavam de nada. Observo a cena a meia distância, abrigado na única sombra que acho, junto a um muro e um banco de concreto.

- Aê, Crioulo, pega o pano aê!
- Negão, dá um valor aqui pra mim!

Chamavam-se, eles mesmos, de crioulo e negão e que tais. Pensei em perguntar o porquê. Dizer na boa que aquilo, de alguma maneira, os desvaloriza e, mais do que isso, desvaloriza a todos nós e tudo o mais. Mas meu impulso professoral - não pela primeira vez - é natimorto. Definitivamente não tenho nenhuma vocação pra convencer ninguém de qualquer coisa que seja. Por ninguém também quero dizer eu mesmo, esteja visto.

- Tá novo, meu chefe!

Pego a carteira e, antes que pudesse abrí-la, o mais desenvolto deles me diz com ar de quem se garante:

- Calma, calma, é melhor não se precipitar. Dá uma olhada aí e vê primeiro se tá bem feito.

Dou uma risadinha de canto de boca. Confiro o resultado displicentemente, pego a chave do carro e deixo dez pratas a mais de gorjeta. Era sexta-feira. E os moleques merecem.





[1] Eu sei que é um troço antiquado, mas ainda não consegui me livrar do carro.

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